Segurança e Saúde no Trabalho dos Profissionais de Polícia
O artigo 118.º do Tratado que instituiu a Comunidade Económica Europeia assinado em 25 de Março de 1957, formaliza o compromisso assumido pelos Estados Membros de promover a melhoria das condições de trabalho dos cidadãos dos respectivos Estados, com a finalidade de proteger a segurança e saúde dos trabalhadores.
Em 1989 a União Europeia procedeu a uma profunda reformulação da sua política para a prevenção de riscos profissionais, adoptando a primeira e mais importante Directiva, designada Directiva - Quadro (Directiva 89/391/CEE, publicada em 12 de Junho de 1989) que veio estabelecer, para os Estados-Membros, um normativo comum e inovador da Prevenção de Riscos Profissionais.
Esta Directiva, transposta para o direito interno português pelo Decreto-Lei n.º 441/91, de 14 de Novembro, foi instituída com o propósito de ser um marco de referência e um quadro jurídico global, que visa garantir uma efectiva prevenção de riscos profissionais. Actualmente, as disposições constam, também, do Código do Trabalho (Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto) e do Regulamento do Código do Trabalho (Lei n.º 35/2004, de 27 de Julho). Recentemente, foi publicada a Lei n.º 9/2006, de 20 de Março, que não alterou estes dois diplomas, na parte que se refere à segurança.
A cultura da prevenção e a protecção da saúde avança muito lentamente nas corporações policiais.
Em 2006, a Comissão Europeia condenou o Reino de Espanha, por incumprimento das obrigações que impendem sobre os Estados Membros, decorrentes da Directiva 89/391/CEE do Conselho, no que respeita à protecção da segurança e saúde dos seus cidadãos, enquanto profissionais de polícia.
Como consequência deste procedimento judicial, em menos de um ano, foi publicada legislação que estabelece normas de prevenção de riscos laborais nos corpos policiais, inspirada nos preceitos da Lei 31/95, que transpôs para o direito interno espanhol a Directiva 89/391/CEE.
Tal como em Espanha, em Portugal, os profissionais de polícia exercem uma profissão que está sujeita ao cumprimento de uma normativa muito específica.
O termo Polícia significa, em geral, a atividade do Estado destinada a assegurar a integridade física e patrimonial dos cidadãos, aplicando as leis e velando para que sejam respeitadas.
Confluem no trabalho policial determinadas variáveis, que operam, muitas vezes, de forma contraditória e causam diversas tensões. Encaramos o agente da polícia como o braço coercivo da Administração (nas facetas de uso da força ou de carácter sancionador); como uma extensão do aparelho judicial; como um funcionário público obrigado a responder às solicitações dos cidadãos; como um mediador social encarregado de resolver problemas da comunidade, sem exercer acção legal ou de força e, até, como conselheiro, a quem as pessoas recorrem para reclamar protecção social.
Por tudo isto, há que tomar em consideração o risco inerente às tarefas que desempenham, os meios, os apoios, os salários e outros elementos com que contam.
O profissional de polícia desempenha um conjunto de actividades, cujo difícil equilíbrio se altera inúmeras vezes, em detrimento da saúde física e mental deles próprios.
Além disso, o profissional de polícia é também um trabalhador que, no desempenho das suas tarefas diárias, está exposto, como qualquer outro trabalhador, a muitos riscos laborais derivados das condições específicas de trabalho.
As tarefas do profissional de polícia são desempenhadas em espaços abertos, em dependências policiais ou de outros organismos públicos. Estudos sobre a incidência do ambiente físico (ruídos, vibrações, etc.) na saúde dos trabalhadores são aplicáveis, também, aos bombeiros e aos profissionais de polícia. A falta de meios e equipamentos de trabalho é uma das principais fontes de stress na actividade policial.
A saúde dos profissionais de polícia é, frequentemente, afectada, dado que as funções são desempenhadas com insuficiência, precariedade ou deterioração de meios, ou incorrecta manutenção deles e está directamente relacionada com uma maior taxa de sinistralidade laboral (sobretudo em acidentes de viação, acidentes em serviço e com manuseamento de armas), afectando também a motivação e bem-estar psicológico deles, para isso as polícias já dispõem de Gabinetes de psicologia
A falta de higiene nos locais de trabalho, sobretudo as inadequadas instalações, camaratas em caves, espaços minúsculos sem ventilação, uma inadequada ou insuficiente limpeza (sujidade, acumulação de pó, humidades, etc.), a falta de ventilação, principalmente, nas instalações sanitárias, é uma fonte de contágio de doenças infecciosas.
Em determinados casos, os profissionais de polícia têm que manejar produtos tóxicos, quer seja na investigação criminal (polícia científica) ou em acidentes de viação, incêndios, etc. que podem provocar acidentes de trabalho, ou intoxicações.
A exposição a doenças infecciosas é outra importante fonte de risco, bem como, a sobrecarga de trabalho, o stress, o trabalho por turnos, o trabalho nocturno e os gratificados.
A permanente exposição a riscos e perigos, ou a simples recordação deles, aumentam os níveis de ansiedade destes profissionais.
O impacto negativo destas situações na saúde dos trabalhadores da polícia traduz-se numa maior probabilidade de contrair doenças gastrointestinais, altos índices de colesterol e doenças coronárias. Actualmente, está demonstrado que o desenvolvimento de patologias, como o transtorno por stress pós-traumático e a depressão são consequência da vivência destas situações.
Os casos de abuso de álcool, ingestão de drogas ou suicídio têm também uma estreita relação com a exposição a perigos e com as duras condições de trabalho que estes profissionais enfrentam.
Nos últimos anos, têm vindo a público notícias sobre baixas médicas por motivos psicológicos, tentativas de suicídio, bem como aposentações antecipadas também por motivos psicológicos. Por outro lado, a incidência de cancro nos profissionais de polícia é superior à média da população.
A estrutura e organização do trabalho policial, muito centralizada, hierárquica e autoritária é uma das mais importantes fontes de problemas para a saúde dos profissionais de polícia.
Esta concepção da administração policial fomenta a falta de participação na estruturação do trabalho e na sua adaptação e melhoria, conduzindo a situações de stress.
A falta de participação e militarização das forças policiais são um motivo forte de tensão e stress laboral e, além disso, está relacionada directamente com uma baixa auto-estima, consumo de álcool, absentismo laboral e depressão.
A vida, a integridade moral e física das pessoas são invioláveis, como direitos garantidos pela Constituição da República Portuguesa.
É tarefa fundamental do Estado promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo..” (artigo 9.º alínea d) da CRP.
O artigo 64.º da CRP prescreve que “Todos têm direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover”, reforçando o n.º 2 que esse direito é realizado pela criação de condições que garantam a melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho”.
O artigo 59.º, n.º 1 alínea c) da CRP estatui que “Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito a prestação de trabalho em condições de higiene, segurança e saúde”
O n.º 2 alínea c) do mesmo artigo prescreve que “Incumbe ao Estado assegurar as condições dos que desempenhem actividades particularmente violentas ou em condições insalubres, tóxicas ou perigosas.
Neste âmbito, não podem os profissionais de polícia ser considerados de modo diferente de qualquer cidadão, até porque a Lei lhes confere poderes especiais.
À semelhança de outros países, em Portugal deveria haver legislação que adaptasse a nossa Lei-quadro – o Decreto-Lei n.º 441/91, de 14 de Novembro, agora substituída pelo Código do Trabalho – e demais legislação à real situação laboral dos profissionais de polícia, proporcionando-lhes as condições mínimas que lhes permitam desempenhar a nobre função na qual estão investidos.
O Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de Setembro, confere aos trabalhadores o “(…) direito à prestação de trabalho em condições de segurança, higiene e saúde asseguradas pela entidade empregadora pública”, que para esse efeito “(…)é obrigada a organizar as actividades de segurança, higiene e saúde no trabalho que visem a prevenção de riscos profissionais e a promoção da saúde do trabalhador (Regime (anexo I), art.º 221.º).
As medidas destinadas a assegurar a segurança e saúde no trabalho assentam em princípios de prevenção que incluem a planificação e organização da prevenção de riscos, a eliminação dos factores de risco e de acidente, a avaliação e controlo dos riscos e a informação, formação, consulta e participação dos trabalhadores e seus representantes, e a promoção e vigilância da saúde dos trabalhadores.
A mesma Lei estabelece que as entidades empregadoras públicas são obrigadas a assegurar aos trabalhadores condições de segurança, higiene e saúde em todos os aspectos relacionados com o trabalho, para o que devem mobilizar os meios necessários e os serviços adequados, internos ou exteriores ao órgão ou serviço, bem como o equipamento de protecção que se torne necessário utilizar (idem, art.º 222.º).
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